Wednesday, May 14, 2008

Por uma vida melhor


Termina já dia 18 a exposição de Gérald Bloncourt, uma exposição de fotografias complementada por documentários acerca da emigraçãp portuguesa em França nos anos 50/60. Numa palavra: impressionante.

Na minha família ninguém fez parte deste movimento migratório massivo e, talvez por isso, não imaginava o quão difíceis foram aqueles tempos. A par da miséria que viviam muitos em Portugal, trabalhando de Sol a Sol e tirando da terra o seu fraco sustento, muitas vezes pautado pela fome, pelo frio e pela frustração de não poder dar aos filhos o conforto e a educação que mereciam, estavam num país atrasado, marcado pela ditadura e pela censura, pela ignorância e pela opressão... e assim partiam "a salto", clandestinos, caminhando descalços pelas montanhas dos pirinéus quando a sola dos sapatos se gastava de vez, passando fome e sede, dormindo ao frio entre as vacas para se aquecerem, até chegarem onde sonharam encontrar trabalho, dinheiro e, assim, uma vida melhor.

Mas encontravam bairros de lata, terrenos de lama, exploração no trabalho, ordenados escassos e atrasados, meses e anos de sofrimento enquanto reconstruiam uma França moderna e desenvolvida, país da Igualdade, Liberdade e Fraternidade, que fechava os olhos à sua presença miserável e desumana. Por cá, nada de novo... apenas um número cada vez maior de fugas clandestinas para esse mesmo destino.

Mas nas cartas à família, confessam eles, apenas contavam coisas maravilhosas, tentando convencer quem ficava que a vida lhes sorria agora, envergonhados de mostrar a sua verdadeira condição.

Os anos passaram para muitos e trouxeram algumas melhorias... pelo menos casas de tijolo e telha, pelo menos a possibilidade de chamar os filhos para junto de si, de os enviar para a escola... Alguns voltaram, atraídos pelo apelo da terra-mãe e das memórias de infância e juventude, finda a ditadura e a guerra colonial que levou tantas vidas na sua geração. Mas os filhos ficaram, os netos nem português falam... e assim se perdem as memórias destas vidas divididas e sofridas.

Os olhos ficaram húmidos muitas vezes ao longo do tempo que ali passei, vendo aquelas imagens e ouvindo aqueles testemunhos. E no final, além da emoção, a clara noção de que muito pouco mudou. Muitos portugueses (e cada vez mais) emigram em busca do que aqui lhes falta, assim como muitos africanos e europeus de leste (só como exemplo) vêm para cá em busca do que lhes falta nas suas terras. E o que encontram? Um país que ignora as suas carências, que os usa como mão de obra barata, marginaliza e deixa acumular nas periferias das grandes cidades em autênticas bidonville à portuguesa.

Em suma, está naquelas salas um conjunto de memórias de uma época que marcou uma geração em dois países e cuja história vemos repetir-se, hoje como no passado, passivamente.

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